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Ministério da Justiça identificou uma série de irregularidades cometidas por bancos e operadoras e promete jogar duro para coibi-las

Depois de muita polêmica e desentendimento interno, o governo decidiu enquadrar o setor de cartões de crédito, que lidera o ranking de reclamações dos consumidores. Entre esta semana e o início da próxima, deve ficar pronto parecer da Secretaria de Direito Econômico (SDE), vinculada ao Ministério da Justiça, sobre o assunto. O relatório detalha os abusos cometidos pelas operadoras na relação com o cliente. Há relatos de pessoas que tiveram seu nome protestado nos órgãos de restrição de crédito porque não pagaram a fatura de um cartão que nem sequer haviam pedido.

Um caso mais grave foi constatado no pagamento parcelado. De posse de dados obtidos com os Procons de 23 estados e do Distrito Federal, servidores da SDE perceberam que uma instituição bancária cobrava tarifa pela transação livre de juros, o que é ilegal. “O consumidor vai fazer uma compra em três vezes ou até em seis vezes sem juros e acaba pagando algum encargo. É uma prática que, aparentemente, se revela absurda. Vamos agir para coibir isso”, avisou o diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, Ricardo Morishita.

Morishita, do DPDC: empresas praticam absurdos, como a cobrança de juros disfarçados e protestos indevidos - (Elza Fiúza/ABr )  
Morishita, do DPDC: empresas praticam absurdos, como a cobrança de juros disfarçados e protestos indevidos

Ele citou estatísticas resultantes do Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas(1), feito pela SDE com base em dados obtidos pelos Procons. De todas as queixas registradas em 2009 na área financeira, 36,48% tinham como alvo problemas com cartões de crédito. Foi o maior índice de protestos nesse setor, ultrapassando o número de arbitrariedades cometidas por bancos, financeiras e operações de leasing. Levando em conta apenas o universo das reclamações dos cartões de crédito, 74,32% eram de consumidores enraivecidos por cobranças indevidas.

O número preocupou o governo de tal forma que a decisão de fechar o cerco às empresas que agem irregularmente partiu do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Ainda bem que o ministro Luiz Paulo Barreto (da Justiça) levou essa questão adiante, e ela, enfim, chegou à mesa do presidente Lula”, disse Morishita. Temendo que os cerca de 30 milhões de brasileiros que ingressaram na Classe C nos últimos anos deixassem de consumir para pagar tarifas de cartões de crédito, o presidente Lula determinou que a SDE agisse para conter os abusos. “Não podemos deixar que a pessoa receba com uma mão e perca com a outra.”

Leniência

Conforme Morishita adiantou ao Correio, a SDE vai enviar nos próximos dias um relatório detalhado dos abusos cometidos pelas empresas de cartões de crédito ao Banco Central (BC) e ao Ministério Público Federal (MPF). A ideia é que a autoridade monetária discipline a cobrança de tarifas, assim como fez com os bancos. O esboço desse trabalho resultaria em uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN). “O BC já fez isso no caso das tarifas bancárias. Não vejo por que não fazer também para o setor de cartões de crédito”, propôs. Ele evita falar no assunto, mas fontes da Justiça reclamam que o BC é leniente com o setor, a ponto de ter afastado o técnico José Antônio Marciano, que defendia ações mais duras contra bancos e operadoras.

Para os representantes do segmento, a casa já está em ordem. “Existe por parte da indústria (de cartões) uma autorregulação, em vigor desde janeiro de 2009, na qual, de forma exaustiva, são tratados os direitos dos consumidores”, assinalou nota da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) divulgada ontem. “Nosso Código de Ética prevê a aplicação de penalidades aos emissores que atuarem em desconformidade às normas ali prescritas.” A avaliação do DPDC é que a fiscalização feita pelas empresas, hoje, é ineficaz. “A autorregulação não tem mostrado efetividade. Se tivesse mostrado, o número de reclamações ao setor não seria tão grande quanto foi nos últimos anos”, atacou Morishita.

Ranking

O Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas funciona como um mapa do mau serviço prestado ao consumidor. Em 2009, os setores que lideraram o ranking de queixas foram os de telefonia fixa e móvel, TV por assinatura e internet. Ao todo, foram registrados cerca de 714 mil atendimentos, dos quais 104 mil resultaram em reclamações formais. Desse montante, 70% chegaram a ser atendidas e 30% não.

SDE multa empresas

As empresas que maltrataram o consumidor e que abusaram da concorrência desleal tiveram de arcar com multas altas em 2009. Relatório de atividades publicado ontem pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) mostra que o valor das sanções aplicadas no ano passado chegou a R$ 23 milhões. Ao todo, houve decisão em 50 processos administrativos: nove foram arquivados e 41 resultaram em condenações.

A fiscalização forte de Procons em todo o Brasil ajudou a secretaria a identificar casos de irregularidades praticadas contra o consumidor. Na maioria das vezes, são situações em que o cliente acaba prejudicado em razão de um serviço mal prestado. Essas reclamações permitiram à secretaria instaurar 32 processos administrativos em 2009.

Internacional

O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), que trata das práticas lesivas ao cidadão, e o Departamento de Proteção e Defesa Econômica (DPDE) coordenaram as ações da SDE na área. O DPDE se concentra em combater a formação de cartéis. No ano passado, a unidade aprofundou as investigações e punições de condutas anticompetitivas e lesivas e realizou a primeira operação internacional de busca e apreensão, em conjunto com autoridades dos Estados Unidos e Europa.


Autor: Deco Bancillon
Fonte: Correio Braziliense

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